Análise
O paradoxo da Suntory: Como um teste de drogas negativo não conseguiu salvar um CEO no Japão

Esta é a história de como um homem legalmente inocente perdeu tudo — e o que isso pode ensinar ao resto do mundo sobre o longo e difícil caminho para a verdadeira normalização da canábis. A recente queda do ex-presidente da Suntory é muito mais do que um escândalo corporativo. É um estudo de caso fascinante e preocupante de uma sociedade onde os factos científicos são impotentes contra o peso esmagador do estigma social.
Um mergulho profundo no conflito entre ciência, direito e estigma social no mercado de canábis mais singular do mundo, o Japão — e o que isso significa para o futuro da indústria global.
Introdução: Uma demissão chocante que não faz sentidoNo dia 1 de Setembro de 2025, uma notícia desconcertante surgiu do Japão: Takeshi Niinami, um homem que ocupava o prestigioso cargo de presidente da Suntory Holdings — um império global de bebidas de 20,000 milhões de euros, comparável à Heineken ou à Pernod Ricard da Europa — renunciou ao seu cargo repentinamente.
A sua demissão ocorreu após uma dramática rusga policial na sua casa, motivada por uma única suspeita: que um suplemento de CBD que ele havia recebido de presente do exterior poderia conter traços de THC ilegal. Mas a rusga não deu em nada. A polícia não conseguiu encontrar o produto em questão. Mais importante ainda, os resultados de um teste de drogas abrangente deram “negativo”. Científica e legalmente, Takeshi Niinami era completamente inocente.
Então, por que é que um homem legalmente inocente foi forçado a sacrificar a sua carreira no auge do sucesso?
Bem-vindo ao Japão, lar de um dos mercados de canábis mais desconcertantes e contraditórios do mundo. A recente queda do ex-presidente da Suntory é muito mais do que um escândalo corporativo. É um estudo de caso fascinante e preocupante de uma sociedade onde os factos científicos são impotentes contra o peso esmagador do estigma social. Esta é a história de como um homem legalmente inocente perdeu tudo — e o que isso pode ensinar ao resto do mundo sobre o longo e difícil caminho para a verdadeira normalização da canábis.
A convicção social – por que Niinami teve que renunciar

No Japão, as buscas online pelo termo “CBD” dispararam a níveis sem precedentes.
Para entender a renúncia de Niinami, é preciso primeiro entender que, no Japão, a percepção pública pode ser mais prejudicial do que uma condenação legal. O caso todo não foi uma batalha judicial, mas um julgamento da opinião pública, e nesse tribunal, ele foi considerado culpado.
Para uma empresa tradicional como a Suntory — um ícone cultural no Japão — a mera suspeita de estar ligado a um escândalo de “drogas” representa um risco inaceitável para a reputação. Não importa que o produto seja CBD ou que o teste de drogas tenha dado negativo. O facto de a polícia estar envolvida e a palavra “canábis” ter sido mencionada nas manchetes foi suficiente para manchar a marca.
O frenesi dos Media foi intenso. No Japão, as buscas online pelo termo “CBD” dispararam a níveis sem precedentes. A história foi noticiada por grandes meios de comunicação internacionais e, ironicamente, o escândalo deu ao CBD o maior destaque público da história do país — pelos motivos errados.
Isso levou a um resultado tipicamente japonês. Na Europa, um CEO nessa posição poderia emitir uma declaração desafiadora, processar por difamação e se manter firme. No Japão, o cenário cultural é diferente. Niinami renunciou para “assumir a responsabilidade” pela perturbação pública (meiwaku) causada pela sua situação. Foi um acto de auto-preservação corporativa, sacrificando um indivíduo para proteger a reputação do colectivo. Esse conflito entre direitos individuais e harmonia social está no cerne do paradoxo de Suntory.
A armadilha legal – por que o CBD se tornou um caso de polícia?
Para entender a tragédia de Niinami, precisamos responder à pergunta fulcral: “Por que é que um produto de bem-estar como um suplemento de CBD se tornaria alvo de uma investigação policial?” A resposta está na estrutura historicamente única das leis de canábis do Japão e num limite absurdamente rigoroso de THC, completamente isolado dos padrões internacionais.
◾️Um legado do passado: de partes da planta a compostos químicos
Antes de mais, é crucial entender que, durante décadas, as leis de canábis do Japão não se baseavam em compostos científicos, mas nas “partes” físicas da planta. A Lei de Controle da Canábis de 1948, estabelecida sob a orientação das Forças Aliadas (GHQ) pós-Segunda Guerra Mundial, isentou os caules e sementes maduros da planta de canábis da regulamentação, proibindo estritamente as flores e folhas. Essa “regulamentação das partes da planta” foi criada muito antes da era dos produtos de CBD.
A 12 de Dezembro de 2024, o Japão finalmente alterou essa lei ultrapassada, caminhando para um sistema de “regulamentação baseada em compostos” com base no teor de THC. À primeira vista, parecia um passo em direcção à modernização. Na realidade, porém, consolidou legalmente um dos regimes de canábis mais rigorosos do mundo.
◾️Uma ilha isolada: Limites irrealistas de THC no Japão
O cerne do problema reside nos “limites permitidos de THC” definidos nessa nova regulamentação. O padrão é menos científico e mais filosófico na sua exigência de níveis próximos de zero. Os limites variam dependendo do tipo de produto, criando um cenário complexo de conformidade.
Veja o que esses números significam: um óleo de CBD de espectro completo padrão, seguro e legal no mercado da UE (a 0,3% ou 3.000 ppm) contém 300 vezes a quantidade de THC permitida em um óleo de CBD no Japão. Ainda mais surpreendente, ele contém 30.000 vezes o limite legal para uma bebida de CBD. Este não é apenas um padrão diferente; é uma realidade jurídica diferente. Quando este padrão foi proposto, atraiu mais de 5,000 comentários públicos questionando a falta de base científica. As autoridades ignoraram amplamente esses apelos.
◾️A Armadilha está montada
Este contexto histórico e a regulamentação extremamente rigorosa montaram a “armadilha legal” na qual Niinami caiu. Da perspectiva da polícia japonesa, a lógica é simples: muitos produtos de CBD do exterior contêm THC no padrão legal local de 0,3%. Segundo a lei japonesa, um produto que contém 0,3% de THC é, sem dúvida, um “narcótico” ilegal.
Portanto, qualquer produto de CBD enviado do exterior merece investigação como um possível caso de tráfico de drogas.
Esse arcabouço legal absurdo dá à polícia motivos suficientes para utilizar as suas ferramentas de investigação mais poderosas, como uma busca domiciliar, mesmo em busca de vestígios de THC sem efeito psicoactivo. O óleo de CBD que você compra para o seu bem-estar em Lisboa pode torná-lo um suspeito criminoso no aeroporto de Tóquio. Essa é a realidade em torno do CBD no Japão.
A lição global – Um conto de advertência para um mundo pós-legalização
Embora possa ser tentador descartar isso como uma história “estranha do Japão”, o caso serve como um alerta crítico para toda a indústria global de canábis. A batalha pela canábis não é vencida apenas no Parlamento; é vencida no tribunal da opinião pública. Nesse sentido, o Japão não é uma anomalia, mas uma versão ampliada de um desafio que todos os mercados enfrentam.
O caso Suntory demonstra que a reforma legal é apenas o primeiro passo. A batalha mais longa e difícil é contra o estigma social profundamente enraizado, que tem sido cultivado há quase um século. Esse estigma pode ser usado como arma contra empresas e indivíduos legítimos, criando riscos que vão muito além do simples cumprimento da lei.
O que aconteceu no Japão revela uma verdade crucial: mesmo num mercado regulamentado legalmente, a sombra da proibição pode persistir, criando um clima em que a suspeita supera a ciência e o medo supera os factos. Este é um alerta para a Europa, onde, apesar das leis progressistas em países como Portugal e Alemanha, a aceitação social subjacente da canábis ainda é um trabalho em andamento. O Japão mostra-nos o pior cenário do que pode acontecer quando essa aceitação social não acompanha a lei.
Conclusão: A ciência deve prevalecer sobre o medo
O paradoxo de Suntory deixa-nos com uma questão crítica, não apenas para o Japão, mas para todos nós: na era da normalização da canábis, o que tem mais poder? A prova científica da inocência ou a sombra persistente de um estigma centenário?
A renúncia de Takeshi Niinami foi uma tragédia, não do crime, mas da cultura. Foi o resultado de uma lei absurdamente rigorosa e de um clima social hipersensível, que decidiu punir um homem por um crime que ele não cometeu. Este caso é um lembrete claro de que o nosso trabalho ainda não terminou. A luta por uma política racional e baseada na ciência para a canábis está longe de terminar, mesmo depois que as próprias leis começarem a mudar. Devemos exigir que as nossas sociedades sejam governadas por evidências, não por medos irracionais.
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[Aviso: Por favor, tenha em atenção que este texto foi originalmente escrito em Português e é traduzido para inglês e outros idiomas através de um tradutor automático. Algumas palavras podem diferir do original e podem verificar-se gralhas ou erros noutras línguas.]____________________________________________________________________________________________________
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Takuya Aiuchi
Takuya Aiuchi é o fundador da principal plataforma de informação sobre CBD do Japão, a "Biblioteca CBD". Pioneiro na indústria, contribui com artigos para os meios de comunicação social nacionais e internacionais sobre canábis e participa extensivamente em exposições internacionais. Takuya envolve-se activamente no avanço do conhecimento e das tendências relativas ao CBD e aos canabinoides nos mercados japonês e internacional.
Aiuchi é ainda membro da Sociedade Japonesa de Canabinoides Clínicos e concluiu com distinção os cursos de Consultor de Canábis MM411, Bem-Estar Médico CBD MM411, Gestor de Assuntos Farmacêuticos Qualificado, Especialista Avançado em Rotulagem de Alimentos Funcionais e Examinador Certificado de Aromaterapia de Nível 1.
